segunda-feira, 19 de março de 2012

CAMINHO


            Ele se sentou no ônibus e olhou pra trás. Viu-a no mesmo lugar de sempre, olhando pela janela como sempre, nem reparando nele. Como sempre. Desde que se entendia por gente, pegava o mesmo ônibus que aquela menina. Bom, na verdade isso só acontecia há um ano e pouco, mas, diabos!, parecia uma eternidade. Ele entrava, olhava pra ela por um tempo, torcia pra que ela olhasse e nada. Só a janela.
            Mais uma vez ela estava longe. Nunca se sentaram juntos. Claro que havia uma parcela de culpa da parte dele. Mas era estranho pegar um ônibus praticamente vazio e sentar justo ao lado de uma menina – convenhamos – linda. Alguém poderia pensar que era assalto ou – pior – que ele era um depravado. E não tinha jeito, ele sempre pegava o ônibus quase vazio, com ela do meio pro fim do carro. Triste. Só restava olhar. E ele olhava.
            A verdade é que, depois de um tempo, aquilo passou a ser a melhor parte do seu dia. Ele se sentava e olhava a menina olhar a janela. De vez em quando, quando falava com alguém no celular ou trocava mensagens com – seu ciúme ridículo sabia – algum retardado que não a merecia, ela dava um sorriso. Daqueles de criança. E ele olhava.
            Um dia ele até tentou puxar conversa. Esperou um tempo de pé o ônibus sair do ponto e, com o solavanco, fingiu quase cair. A menina o olhou e ele soltou um “opa!” animado, mas foi ignorado. Ela deu um sorrisinho pra baixo e escreveu alguma coisa no celular. Tinha virado motivo de piada. Quase caíra por um sorriso e ganhou deboche. Ridículo.
            Uma vez, resolveu tentar a sorte. Sentou-se mais perto da menina, viu que ela fazia palavras cruzadas e, todo bobo, tirou um jornal da mochila. Abriu suas cruzadinhas, resolveu algumas palavras, procurou uma dica difícil e perguntou, sem nem dar tempo pra vergonha chegar à boca:
-       Desajeitado, dez letras. Sabe?
Ela nem levantou os olhos.
-       Desastrado.
Ele pensou um pouco e olhou pro papel. Desastrado cabia certinho.
-       Não. Tem um “n” no meio.
Ela levantou os olhos. O coração dele quase fez seus próprios olhos soltarem pela janela dela. A menina colocou a caneta no canto da boca, cerrou as pálpebras e sorriu feliz, de um jeito que fez o menino se derreter todo:
-       Estabanado.
Sem palavras, ele não fez nada enquanto ela se levantava e descia no ponto de sempre. Só olhou, bobo. E completamente apaixonado.
As meninas não entendem nada...

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